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A minha avó
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- Name
- Joaquim Rocha
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Como é normal para as crianças que crescem numa aldeia pequena, os meus avós estiveram sempre muito presentes na minha infância, especialmente os paternos.
A minha Avó Maria deu-me tudo o que uma Avó pode dar a um neto. Lembro-me dela me acordar, quando eu ainda andava na escola primária, e me ajudar a vestir porque eu era um preguiçoso ao acordar; depois lavava-me a cara com água fria e, quando eu protestava, ela dizia que os velhos é que lavavam a cara com água quente.
Ela fazia-me todos mimos no que toca a comida, pratos que comi pela última vez cozinhados por ela, uns conhecidos, outros nem por isso: fatias de ovo (ou fatias douradas), torradas feitas no lume ou braseira, tiborna, almece ou papas de milho.
Como toda a gente a sua idade, a minha Avó não teve uma vida fácil. Começou a trabalhar bem antes dos seus 10 anos. Nunca pôde frequentar uma escola, eram outros tempos. Mesmo sem sabia ler nem escrever, tinha um sistema seu para fazer contas (não sei se o inventou ou aprendeu) e batia certo.
Quando penso no dificil que a vida era nesses tempos (ou mesmo na infância dos meus pais), sinto-me envergonhado por às vezes me sentir insatisfeito ou frustrado com alguma coisa na minha vida…
A minha avó nunca teve muita saúde, mas foi sempre resistente. Sempre uma velhota desde que a conheci e com um coração fraco, esteve internada no hospital várias vezes, entre a quais teve que meter um pacemaker. Há cerca de um ano caiu da cama e partiu uma anca. Era uma idade muito complicada para tal fractura e pensámos no pior. Os médicos disseram que não iria volta a andar… Seis meses depois andava com a ajuda de um andarilho e, excepto nos piores momentos, esteve sempre lúcida.
A minha avó foi feliz. Nunca foi abandonada como hoje acontece muito na nossa sociedade. Mesmo quando passou a viver num lar de idosos, teve sempre a visita dos filhos regularmente e dos netos quando era possível (todos vivem longe), e só não passou dois Natais com a família: quando esteve no hospital pela fractura da anca e este ano.
A minha avó faleceu na noite de 2 de Dezembro e eu não pude ir ao seu funeral. Na minha cultura, tal é algo sério, mas logisticamente era muito complicado e preferi não deixar a minha mulher grávida sozinha noutro país. A minha avó seria a primeira a compreender.
Tenho pena da minha avó já não conhecer a segunda bisneta mas fico feliz de ela não ter passado muito tempo em sufrimento e ter tido sempre a família com ela. Agora só gostava de lhe poder agradecer por tudo, dizer-lhe que contarei à minha filha sobre a ela e a sua vida e dizer-lhe para descansar em paz.